quinta-feira, 29 de maio de 2008


EDSON JOSÉ VALGAS



ESCOLA DA PONTE


PORTUGAL



Vou falar um pouco de um conceito, ou melhor, uma escola nada convencional para os padrões do Brasil; uma escola onde não existem diretores, salas de aulas, divisão por idade ou série e tão pouco um currículo obrigatório. São os próprios alunos que escolhem o tema a ser estudado. A cada 15 dias, com a mediação de um professor, verificam se alcançaram os objetivos, e constatado o aproveitamento, recomeçam novamente. uma escola que alcançou a incrível façanha de se tornar autônoma perante o governo de Portugal; situada em Vila das Aves, cidade de 10 mil habitantes, a alguns quilômetros da cidade do Porto que há mais de trinta anos vem transmitindo conhecimentos à seus alunos de uma maneira mais que original, inovadora: “A Escola da Ponte.”


O idealizador da “Escola da Ponte”, projeto que ignora totalmente o tradicionalismo, foi o anarquista convicto e educador José Pacheco. Vivendo hoje em São Paulo, ele visita escolas públicas e particulares pelo Brasil toda a semana, dando palestras e verificando a influência que a mítica escola exerce sobre muitas delas. Numa entrevista publicada em fev. 2007, Ed nº. 13, à editora de “Carta na Escola” Lívia Perozim, Pacheco fala do começo conturbado dessa nova proposta de ensino, que teve o seu início em 1976, período pós-ditadura de Salazar. Ele conta que o clima era totalmente adverso naquela época, fazendo-o ocultar do governo de Portugal suas práticas de ensino durante dez anos. Com instalações precárias, a escola nascia num cenário de miséria. Pacheco: “Era uma desgraça, uma miséria. Algo revoltante. E olha que eu tive o privilégio de nascer na miséria.”


Com um início que tinha tudo para ter começo e fim, a escola da ponte funcionava em duas escolas, sendo que uma delas era clandestina e Pacheco se revezava com mais dois professores para dar aulas para 120 alunos. Para driblar o Ministério da Educação de Portugal, os alunos e os pais eram instruídos a mentir sobre a série e o que acontecia na escola. Relatórios forjados foram elaborados, pois se o governo soubesse do que realmente acontecia lá, acabariam com tudo. “Por isso digo às pessoas que querem fazer diferente: vão devagar. Grandes metas; pequenos passos. O maior inimigo do professor é o professor.” Ao fim de 10 anos, com o apoio dos pais, a Escola da Ponte tinha suas próprias instalações.


Mais que uma nova pedagogia, a Escola da Ponte era um projeto político, já que Pacheco chegou a ser prefeito de Vila das Aves no período de 1983 a 1985, tempo que serviu para acabar de vez com a ditadura dos coronéis na cidade. Esse tempo serviu para José Pacheco entender que o futuro da Escola seguiria o da sociedade, afastando-se da prefeitura após perceber outra coisa: “Percebi que era muito fácil ser corrupto, e, se todo homem tem um preço, eu não queria saber qual era o meu.” Comenta o professor.


Quando questionado sobre a criação ou não de uma teoria na nova escola, Pacheco diz: “Há um antes e um depois da Escola da Ponte na história da educação.” O mentor da Escola comenta também que as escolas que vierem a clonar a Ponte estarão fadadas ao fracasso. “Muitos dizem: faço como a Ponte e nada resulta. Percebe? Quem quiser fazer como a Ponte só pode esperar o insucesso.” Para José Pacheco imitar esse projeto seria inviável, já que, como ele mesmo define, a Escola da Ponte não é um plano completo e precisa se renovar, manter-se sempre atual. Segundo ele: “Na educação está tudo por inventar, estando tudo inventado. Há muita teoria e prática. Ou seja, por mais que façamos de novo, é sempre antigo.”


A editora Lívia Perozim pergunta à Pacheco: “E a Ponte mantém-se fiel ao projeto originário? Com mais de 50 anos de experiência na educação e sempre como um olhar desconfiado, o anarquista responde: “Estamos passando por uma fase crítica. E isso custa muito, não queria dizê-lo, mas é a verdade. Aliás, é por isso que considero que a Ponte terá futuro, porque o coordenador atual, meu ex-aluno e um excelente profissional, passa por um mau bocado. É preciso agora não recuperar o que foi feito, mas retornar o caminho dentro dos princípios do projeto da Ponte.” Ele diz também que é errado ver a Ponte como um mito, pois para ele, a escola é igual as outras e corre o risco de acabar, devido as más administrações de pessoas que tiveram tempo para destruir o que ele ao longo dos anos construiu e fará uma tentativa para ajudá-la, mas... “se ela não tiver a possibilidade de se recuperar, eu escrevo: o projeto da Ponte acabou.”


“Estou sempre a conspirar.” É o lema de Pacheco. E nesta conspiração, ele está preparando um novo projeto, o qual levará aproximadamente quatro anos de dedicação intensa, sendo esse de autoria coletiva. Só podemos esperar para saber se o projeto terá a mesma repercussão da Escola da Ponte.


Sempre em viagens pelo Brasil, o mentor da Ponte fica indignado com algumas situações escolares e com os salários miseráveis que os professores recebem. Comenta que o país não os merece, para ele esses professores são verdadeiros heróis. “É no tradicional que nasce o novo. Eu sou muito criticado por isso, pelos meus amigos anarquistas. Agora até me chamam de neoliberal, porque eu defendo que as escolas contratem pessoas e as despeçam imediatamente se não forem bons profissionais. O pior que pode haver numa escola são prostitutos da educação.”


Lívia questiona: “A Escola da Ponte ganhou popularidade entre os educadores brasileiros através do livro do educador Rubem Alves, A Escola com Que Sempre Sonhei sem Imaginar Que Pudesse Existir. Em sua opinião, a Ponte é aquilo que o autor descreve nessa obra? Pacheco responde: “Sou grato ao Rubem Alves. Não quero ser injusto, até porque lhe devo esta oportunidade de começar a minha vida aqui. Ele é um poeta, um pedagogo nato, intuitivo, e escreveu sua impressão de viagem, de vista. O que vejo naquele livro é um relato maravilhoso, mas que, nas mãos dos incautos, pode transformar a Ponte num mito.”

9 comentários:

Cold Line Band disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cold Line Band disse...
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Cold Line Band disse...

Realmente eu tinha ficado fascinado com a escola da ponte,mas agora fiquei mais ainda por todo o processo que ela passou para se fixar em um periodo conturbado que se vivenciava em Portugal.Realmente José pacheco é um dos grandes educadores da lingua portuguesa, pela coragem digna e respeituosa que usou na aréa da educação.Criou uma escola de personalidade própria,onde o conhecimento gira em torno de todos em um interacionismo brilhante.

Gostei muito da sua reportagem meu caro colega interagente Edson.

Um abração de Roberto

Anônimo disse...

Para nos estudantes de Letras sabemos que esta escola é um sonho real, porem somente na cidade do Porto,é de nosso conhecimento que é uma escola modelo e eu gostaria de ter o prazer de visita-la algun
dia ,sabemos que é verdadeira, no entanto dificil de amplia-la. pois o que parece me segundo Candau, para os governantes ter o domínio sobre um povo nada mais de que mante-los na ignorância

Curso de Letras da UNISUL disse...

Edson, realmente a Escola da Ponte é uma escola diferente e, já é de nosso conhecimento, tmbém sabemos que o professor José Pacheco é um grande Mestre em Língua portuguesa. Mas você fez nos relembrar, valeu!

Um abraço;
Valter

Anônimo disse...

Essa e a escola dos sonhos, mas uma pouco distante da nossa realidade. Cabe a nos futuros professores inovar e fazer a diferença.
Parabéns pelo tema.

Abraço

Lucia

Curso de Letras da UNISUL disse...

adorei seu comentario.gostaria de poder conhecer a esta escola.

Anônimo disse...

gostei muito dessa escola da ponteque você fala. Gostaria de poder conhece-la,pois ela é um grande sonho que os alunos de letrasgostariam de realizar.

Curso de Letras da UNISUL disse...

A Escola da Ponte realmente é modelo de educação. Dinâmica e motivadora.
Cris